Uma história de luta e resistência pela educação do povo negro
- lavinicastro
- 6 de ago. de 2020
- 4 min de leitura
Atualizado: 19 de set. de 2020
O fim da escravidão não livro os negros da discriminação, o racismo apenas se reformulou. Após a abolição era preciso resistir a novas formas de opressão. Negras e negros saíd@s do sistema escravista precisaram se reinventar diante do que especialistas passaram a chamar de “segunda abolição” (Santos 2005, p. 21 apud Fernandes 1978). Era preciso formar novas estratégias para alçar capitais sociais para garantir dignidade de suas vidas. Conforme nos conta Santos: “os negros perceberam rapidamente que tinham que criar técnicas sócias para melhorar a sua posição social e/ou obter mobilidade social vertical, visando superar a condição de excluídos ou miseráveis” (SANTOS, 2005, p. 21)
Dentro desse cenário, a percepção de muitas negras e negros foi identificar o espaço da educação como forma de ascensão social. portanto a escola passou a ser um “veículo de ascensão social” (Santos, 2005, p. 22). Não foi a toa que Abdias do Nascimento indicava a necessidade de uma educação formal para as negras e negros como forma de superar a exclusão social. Assim umas das lutas do Movimento Negro, no que diz respeito a educação era ampliar o ensino gratuito em todos os níveis escolares*.
A escola, apesar de ainda hoje ser desafiada a tratar de assuntos referentes as relações raciais, sobre assuntos sobre a diversidade e pluralidade de percepções de mundo, foi no período inicial da “segunda abolição” um meio de integração e ascenção. De fato, precisamos concordar com os estudos que apresentam a escola como um local em que perpetuam valores hegemônicos, eurocêntricos e as mazelas das desigualdades sociais, entretanto as negras e negros que buscavam instrução para alcançar o mercado de trabalho, a escola, enquanto ambiente de educação formal, era o local da possível mobilidade econômica na vida de muitas famílias negras que conseguiram adentrar esse espaço.
Tão logo estivessem usufruindo da instituição seria o momento de questionar a perpetuação do racismo de dentro daquele espaço questionando e embranquecimento cultural. Percebendo a desvalorização de negras e negros os movimentos sociais negros incluíam em sua agenda de lutas uma educação mais democrática.
Não há como não reconhecer o papel dos Movimentos Negros na construção de um projeto educativo antirracista que evidencie a urgência de emancipação social e política desse grupo racial.
Através do TEN, na década de 1950, foi promovido o I Congresso do Negro Brasileiro em que se recomendava o estudo sobre a história e cultura africanas. Mas, de acordo com Santos, apoiado em Hasenbalg (1978), foi na década de 1970 que a agenda negra , de fato, contemplou a educação no combate a discriminação racial nas escolas, pelo acesso ao ensino as negras e negros, propondo a reformulação do currículo enfatizando o papel do negro na história brasileira, por exemplo. Podemos identificar que antes da Lei 10.639/2003 outras reinvidicações no campo educacional já eram pauta dos Movimentos Negros.
No ano de 1986, ocorreu a Convenção Nacional do Negro pela Constituinte trazendo como reivindicação o respeito a cultura brasileira e a obrigatoriedade da inclusão da História da África e da História do Negro no Brasil. Em 1995, o então presidente Fernando Henrique Cardoso recebeu um documento dos movimentos negro intitulado: Programa de Superação do Racismo e da Desigualdade Racial com propostas antirracistas. De acordo com Santos (2005, p. 25), a proposta ia desde a formação de uma Convenção sobre Eliminação da Discriminação Racial no ensino a monitoramento de livros e materiais didáticos. Nesse sentido:
“Alguns municípios passaram a impedir a adoção de livros didáticos que disseminavam preconceito e discriminação raciais. As Leis Orgânicas dos Municípios de Salvador9 e Belo Horizonte, por exemplo, estabelecem no artigo 183, § 6ª e no artigo 163, § 4ª, respectivamente, que “é vedada a adoção de livro didático que dissemine qualquer forma de discriminação ou preconceito” (Leis Orgânicas dos Municípios de Salvador e Belo Horizonte apud Silva Junior, 1998: 115 e 173). Este mesmo objetivo é buscado na Lei Orgânica do Município de Teresina, promulgada em 26 de julho de 1999, artigo 223, inciso IX, que estabelece a “garantia de educação igualitária, com eliminação de estereótipos sexuais, racistas e sociais dos livros didáticos, em atividades curriculares e extracurriculares” (Lei Orgânica do Município de Teresina apud SOARES, 2001). Também percebemos esta preocupação na Lei Orgânica do Município do Rio de Janeiro, promulgada em 5 de abril de 1990, no artigo 321, inciso VIII, a qual estabelece que o ensino será ministrado com base no princípio de uma “educação igualitária, eliminando estereótipos sexistas, racistas e sociais das aulas, cursos, livros didáticos ou de leitura complementar e manuais escolares” (Lei Orgânica do Município do Rio de Janeiro apud SILVA JUNIOR, 1998: 212)” (SANTOS, 2005, p. 26)
A década de 1990 foi atravessada de ações de luta de diversos movimentos negros em diversos municípios e estados, o que projetou no início do século XXI, no ano de 2003, o reconhecimento federal, do então Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, das injustiça e discriminações raciais contra os negros no Brasil e a necessidade de promover uma lei federal que promovesse um ensino democrático de base nacional.
Após esse breve panorama, pode se vislumbrada a Lei 10.639/2003. Entretanto precisamos reforçar sua aplicação e observar as estratégias dentro da lei que são histórias de sucesso para muitos professor@s e estudantes.
*Você pode ver mais sobre esse assunto no artigo de Sales Augusto dos Santo, A Lei nº 10.639/03 como fruto da luta anti-racista do Movimento Negro pag 22, em que o autor apresenta um informe contido no Jornal Quilombo dirigido por Abdias do Nascimento em que afirma-se a estratégia de luta do movimento negro no campo educacional.
Eu sou Lavini Castro
Educadora Antirracista
Referencias Bibliográficas
SANTOS, Sales Augusto dos. A Lei no 10.639/03 como fruto da luta anti-racista do Movimento Negro. Sales Augusto dos Santos. In: Educação anti-racista : caminhos abertos pela Lei Federal nº 10.639/03 / Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade. – Brasília : Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, 2005.

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